domingo, 26 de agosto de 2012

Trilogia de Christopher Nolan


“E se você fosse mais que apenas um homem, e desse tudo de si por um ideal, e ninguém conseguisse te deter? Ai, você se tornaria algo diferente... uma lenda, senhor Wayne, uma lenda.”

Essa citação dita por Ras All Ghul, em Batman Begins resume perfeitamente tudo o que foi feito na trilogia Cavaleiro das Trevas de Christopher Nolan. Embora o Batman vivido por Christian Bale não seja o definitivo dos quadrinhos, e é um pouco diferente da sua fonte original; fica claro que o filme conseguiu entender tudo o que representa o mito do Homem Morcego, desde sua essência.
O Batman de Christopher Nolan é real. Sua proposta era nos fazer acreditar que ele podia existir. E por isso, muitas vezes parece ser vulnerável, ao contrário das HQ. Apesar do esforço de Nolan, ele continuou como o herói que nunca se machuca, afinal, nos três filmes só teve dois oponentes que fossem um desafio físico (Ras All Ghul e Bane). Os outros vilões foram grupos grandes, de inimigos em um nível bem mais baixo do que o dele, em que ele enfrentou sem grandes problemas, mesmo que saísse com ferimentos. Mas a grande diferença é o ar arrogante que ele possui nas HQ, e não tem nos filmes, mesmo com dilemas morais, questionando suas atitudes, sempre tendo a certeza de estar sempre certo. A arrogância que o faz peitar o Super Homem dizendo “Essa cidade é minha, cai fora”.



No início vemos Bruce perdido quanto as suas intenções. Querendo justiça e vingança, mas não sabendo distingui-las. Com medos de infância. Somente quando encontra Ras, que começa a se encontrar, com o treinamento. Treina para superar a raiva e controlar seus medos e mais para frente, se tornou o próprio medo.
Logo que Bruce retorna para Gotham, mesmo com todo treinamento e arsenal, ele sabe que precisa de mais alguma coisa (remetendo ao quadrinho Batman Ano 1 de Frank Miller). Ele sabe que para levar o medo ao coração dos criminosos e inspirar esperança para os cidadãos de Gotham, era necessário se tornar um símbolo. Um símbolo é quando se atribui um valor abstrato que vai além de seu real significado passando assim, a significar algo que vai além do que ele próprio. A escolha de Bruce Wayne, um morcego, representava seu medo de infância. “Morcegos me assustam. É hora de meus inimigos compartilharem desse pavor” – Diz Bruce para Alfred. E ao final do filme, vemos a construção do símbolo no momento em que se cria o batsinal.



Em sua sequência vemos as repercussões das ações do Batman. Como as pessoas comuns, que inspiradas pelo Homem Morcego, passam a se fantasiar dele e agir como vigilantes. Os dois principais casos são: 1º - o promotor público Harvey Dent, também conhecido como Duas Caras. Que age dentro da lei colocando os criminosos na cadeia. Inclusive é criada uma parceria com Gordon, Batman e Harvey; para que conseguissem as provas necessárias para os julgamentos. O segundo caso foi com o Coringa -  "Enquanto analisávamos os quadrinhos, houve uma ideia fascinante que a presença de Batman em Gotham atrai, de fato, os criminosos a Gotham. Ela atrai os lunáticos. Quando você está lidando com questões polêmicas, como a 'justiça com as próprias mãos', você precisa realmente se perguntar: 'aonde isso leva?'. É isso que deixa a personagem tão obscuro, porque ela expressa um desejo vingativo." - Nolan, falando sobre a continuação.
O filme é uma união das HQ Longo dia das Bruxas de Joeh Loeb e A Piada Mortal de Alam Moore. A primeira tem a origem do Duas Caras. No filme temos a união entre Harvey e Batman para derrubar a máfia. A cena do dinheiro sendo queimado (nos quadrinhos pelo Batman e Havey, no filme pelo Coringa) é o momento onde há o nascimento de um novo tipo de criminoso, mais insano, que cresce a medida que a máfia cai:
“Você mudou as coisas, para sempre” – diz Coringa para Batman
“Vocês só pesam em dinheiro. Gotham merece um tipo melhor de criminosos. E eu vou dar isso a ela.” – Diz Coringa para um mafioso.

Na segunda HQ, Coringa conta sua origem. No filme, foi transpassado apenas a ideia, em que ele não se lembra de seu passado e acredita que uma pessoa só pode ser honesta até aonde a sociedade permite. Tentando assim corromper inocentes (nos quadrinhos tenta corromper Gordon, mas falha. No filme começa com a própria cidade e depois com Harvey, e consegue). Harvey Dent com o tempo vai se tornando um símbolo de justiça e esperança para a cidade.
“Você é o sinal de esperança que eu nunca consegui ser” – diz Batman ao Dent.

Coringa leva a cidade ao caos e no final destrói sua única fonte de esperança. Batman para tentar manter as esperanças de uma cidade desesperada por uma figura heróica acaba por sacrificar tudo o que ele mesmo representa e assumindo a culpa pela morte de Harvey e pelos seus crimes.
O segundo filme trata da alma de Gotham e das consequências de nossas escolhas. Vemos Bruce refletindo sobre a própria existência do Batman e o que ele representa, e ao final, ficamos sabendo que aposenta o manto. O que nos leva ao terceiro e último filme: Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge. Ao longo dos dois primeiros filmes acompanhamos Batman de Nolan construindo e desconstruindo um símbolo, e agora, o vemos reconstruindo o símbolo, o mito.


O terceiro filme já começa oito anos após o Cavaleiro das Trevas. Bruce aposentou o manto e Dent vira um mártir tendo a imagem usada para a criação de uma lei, que foi a responsável pelo fim da máfia. Bruce não aparece em publico há anos e Gotham vive um período de relativa paz. Mas apenas relativa, pois vemos que o crime organizado praticamente se extinguiu, mas a corrupção ainda existe e a diferença entre as classes mais favorecidas das classes menos favorecidas estão cada vez maior. Até o surgimento de uma nova ameaça.
A aposentadoria do manto do morcego está relacionada a uma das grandes HQ do Homem Morcego, Cavaleiro das Trevas de Frank Miller. O que nos leva a outro ponto de referencia na obra de Frank Miller: o porquê Bruce Wayne ser o Batman. Desde o início ele se refugiou dentro de sua mansão criando historias de “unhas de 20cm”, “rosto cheio de cicatrizes”. Quando surge uma ladra em seus aposentos, e ele está de volta a batcaverna. Como o próprio Alfred se refere, o seu patrão estava apenas esperando as coisas piorarem novamente. Portanto a resposta é: Bruce é o Batman porque ele quer. A morte dos pais é o primeiro empurrão, fazer justiça é apenas ao que Bruce direciona o Batman.


O filme também trata a seguinte questão: vale a pena viver uma mentira? Logo no início vemos Gordon com crise de consciência por condenar o homem que salvou sua família e toda a cidade para que endeusassem aquele que tentou assassinar seu filho.  Quando Bane finalmente aparece, a paz está por um fio e Batman é forçado a voltar em um retorno espetacular, com citações diretas dos quadrinhos “garoto, se prepare para ver um show essa noite, filho”.
O filme volta a tratar da questão do símbolo. A ausência do Batman foi sentida não só por Gordon, como por todos os cidadãos da cidade. Notamos isso logo no começo com os policiais que não se esforçam para pega-lo, e também pela nova personagem: John Blake, que revela ser o Robin.  O policial acaba sendo todos os Robins, ao mesmo tempo em que nenhum deles.

Explicando:
John Blake é policial assim como Dick Grayson que foi o primeiro Robin. Possui pai que morreu nas mãos de agiota e não conheceu a mãe, assim como o segundo Robin, Jason Todd. Ele descobre a identidade do Batman sozinho assim como o terceiro, Tim Drake. O quarto é o Daimian Wayne (sim, o filho de Bruce), que possui o apelido de "esquentadinho". É ele que mostra qual foi a importância do símbolo que Bruce construiu com Batman. Papel que Robin sempre teve que empenhar nas HQ: a de equilibrar o Batman, e por vez, substituí-lo.”

Bane, é um vilão que nas HQ foi criado por uma necessidade mercadológica. A de recriar o que foi feito com o Super Homem. Matar (no caso foi só quebrar) o Morcego. E por isso nunca foi devidamente utilizado. Mas aqui ele ganha uma nova roupagem, sem perder sua essência. Ele está grande, mete medo, é frio e calculista. E sim, ele quebra a coluna do Batman, assim como foi nos quadrinhos. Possui uma união do que ocorre em Cavaleiro das Trevas de Frank Miller e a saga A Queda do Morcego. Na saga, Bane leva o Batman até seu limite para depois quebrá-lo. Na obra de Frank Miller, Bruce já está velho e por isso perde o primeiro confronto contra o Líder Mutante. No filme vemos que alguém que dedicou a vida para o combate contra o crime sem muito apoio, não consegue ter uma vida sem sequelas. Bruce não esta em seu melhor estado desde o início do filme, além de ter relaxado por está oito anos parado. E devido a isso ele não consegue lutar em pé de igualdade contra Bane. O vilão também não deixa de “quebrar o espírito do Batman”. Só que aqui ele o coloca em uma prisão para que assista a sua cidade cair.
O filme Cavaleiro das Trevas - 2008, não possui uma ligação direta com Batman Begins. Funcionam como filmes independentes. Já Cavaleiro das Trevas Ressurge, remete diretamente aos dois filmes anteriores sendo assim, melhor assisti-los em sequência. Há o retorno da imagem de Ras All Ghul. Falo a imagem, porque ele morre em Batman Begins. No entanto, foi o responsável pelo treinamento de Bane que junto com a sua filha Talia, aparecem para terminar sua obra. Referência essa as HQ “O Legado do Demônio”, que mostra esta aliança. E referência a saga “Terra de ninguém”, em que Gotham após um terremoto fica largada pelo governo e Bruce tem que juntar forças para reconstruir sua cidade. No filme, o vilão implanta uma arma atômica na cidade forçando o governo a recuar.
Durante a trilogia, podemos notar que todos os vilões são reflexos do próprio Batman. Ras All Ghul é um vilão idealista que tem o mesmo objetivo do herói, com a diferença de que é mais radical, chegando ao ponto de matar. Espantalho é um vilão que usa do medo como arma, assim como o Batman. A diferença é que o herói superou e se tornou o próprio medo, enquanto o vilão é covarde e usa de um gás para provocar medo e se sentir em posição de superioridade. Duas Caras é, segundo o próprio Bruce disse:
“Aquilo que eu deveria ter me tornado para salvar Gotham, um herói de face que não usa máscara.”

No entanto também representa o que Bruce poderia ter se tornado caso não aguentasse a pressão e sucumbisse. Bane é o Batman de outro mundo. Tem o mesmo treinamento, é racional, estrategista, usa dos mesmos meios e pode fazer tudo o que o Morcego faz. Porém estão em lados opostos e isso é mostrado quando Ras pede para Bruce matar e ele não o faz. Já o Bane faria sem sentir nenhum remorso. Já o Coringa é o perfeito antagonista, o reflexo no espelho. E como todo reflexo é a imagem invertida, ele não tem treinamento, é irracional e imprevisível; totalmente o oposto do Batman. E principalmente é a inversão do próprio símbolo. Símbolo que podemos notar seu poder na cena em que Batman cria o desenho em fogo em um prédio, fazendo com que todos os policiais irem as ruas lutar pela sua cidade.
Ao contrário dos quadrinhos que a personagem é eterna, aqui ela teve um fim. O que talvez seja um presente de Nolan para o Bruce. Ninguém mais do que ele merece ser feliz. O mito do homem que juntou todas as forças para construir um símbolo de esperança e justiça, foi mais que devidamente representado.

Escrito por Felipe Utsch

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